Quando eu entrei na USP em 1977, Fonoaudiologia para mim significava apenas trabalhar com crianças surdas. Éramos 15 alunas indo e vindo entre a Faculdade de Medicina na Dr. Arnaldo e a Cidade Universitária da USP. Eu com meu fusca azul e a Sivi com seu chevette vermelho. Fui então aprendendo que a Fonoaudiologia era um campo de conhecimento muito mais amplo do que eu imaginara.
Foi a professora e fonoaudióloga Maria Alice de Mattos Pimenta quem introduziu a afasia em minha vida, em um breve curso ainda na graduação (depois seguiram-se cursos, grupos de estudo, supervisão, congressos, grande mestra).
Um dia, já no último ano do Curso, eu estava no Centro Acadêmico Arnaldo Vieira de Carvalho – que na época ficava no porão da Faculdade de Medicina. Alguém entrou na salinha – era minúscula! – e gritou: Quem quer atender uma afasia? Eu! Eu! E foi assim que eu conheci a dona Maria Luiza, uma senhora que se tornara afásica após um AVC e que morava no Alto do Mandaqui. E lá ia eu com meu fusca azul atender dona Maria Luiza duas vezes por semana. Foi minha primeira paciente afásica.
Terminei a graduação em Fonoaudiologia e fui convidada para trabalhar no consultório das fonoaudiólogas Maria Isabel Machado de Campos e Lívia Maria Pedallini que atuavam no Hospital das Clínicas e supervisionavam o estágio de Fonoaudiologia da FMUSP. Aprendi muito com elas. E dona Maria Luiza continuou a ser por mim atendida, só que agora ela vinha até Pinheiros.
Comecei a trabalhar na Prefeitura de São Paulo, no Departamento de Saúde Escolar. Decidi estudar Linguística. Prestei novo vestibular na USP e entrei na FFLCH. Dei aulas na USP, no curso de Fonoaudiologia, como professora convidada.
Decidi que era o momento de alçar voo e ter minha própria clínica. Conheci então as psicólogas Renata Aleotti e Antonietta Donato, que se tornariam grandes amigas. Trabalhamos juntas até hoje. Deixei o trabalho na Prefeitura de São Paulo.
Da USP segui para a PUC, onde fui professora da Faculdade de Fonoaudiologia por 18 anos. Maria Alice de Mattos Pimenta foi professora da PUC. Dava aulas sobre Afasia e o estágio dos alunos era no Hospital do Servidor Público Estadual. Em 1988, Maria Alice foi para a USP e, generosa como sempre, me deixou um legado: assumi seu curso e o estágio no Hospital do Servidor. A partir desta experiência, propus a disciplina Linguagem do Envelhecer, com estágio no Hospital Geriátrico e de Convalescentes D. Pedro II, da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Foram mais de 10 anos no Jaçanã. Estudando Afasia e Envelhecimento, convivendo e aprendendo com alunos, com idosos e com afásicos. Ensino, Pesquisa e Clínica foram pautando minha trajetória.
No Mestrado em Fonoaudiologia na PUC, a professora Suzana Magalhães Maia e o professor (e orientador) Milton José Almeida foram fundamentais para que eu pudesse contar a história do alfaiate italiano que se tornou afásico.
Maria Alice de Mattos Pimenta abriu mais uma porta ao me indicar, juntamente com outra grande amiga fonoaudióloga – Clara Nagamine Hori –, para um projeto do Professor Yves Joanette: o livro L’Aphasique não só seria traduzido por nós para o português, como também escreveríamos dois capítulos sobre os afásicos no Brasil e organizaríamos o capítulo sobre os afásicos em Portugal.
Eu já conhecia o trabalho das professoras Maria Irma Hadler Coudry e Edwiges Maria Morato do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp, principalmente o projeto desenvolvido no Centro de Convivência de Afásicos (CCA). E lá fui eu para Campinas, decidida a fazer o Doutorado. Frequentei o CCA por vários anos e a Professora Edwiges foi orientadora de minha Tese. Escrevemos a muitas mãos (afásicas e não afásicas) o livro Sobre as afasias e os afásicos, tema de minha Tese. Foram muitos anos de aprendizagem, convivência e trocas.
Sai da PUC – não por decisão minha, mas por circunstâncias da própria faculdade de Fonoaudiologia – e deixei o ensino. Mas continuei a vida acadêmica como pesquisadora no IEL no grupo de pesquisa COGITES – sob a coordenação da Professora Dra. Edwiges Maria Morato – até 2012.
Atualmente me dedico exclusivamente ao trabalho clínico. Continuo estudando. Desde 2001 coordeno o Grupo Pauliceia, que integra pessoas afásicas e não afásicas em projetos de linguagem.
Há três anos a fonoaudióloga e amiga Sandra Cazelato chegou para contribuir com seu conhecimento e dinamismo. De nossa parceria, a construção do Portal da Afasia.
Não caminhei sozinha. O médico neurologista Prof. Dr. Milberto Scaff me possibilitou conhecer e trabalhar com muitas pessoas afásicas. Meus queridos pais – Sergio Tubero e Ivany Fiorezzi Tubero – sempre me incentivaram.
Tenho 56 anos e sou fonoaudióloga há 35 anos. Nos últimos 25 anos tenho tido o privilégio de conviver com alguém que me apoia, encoraja, desafia, compartilha: George Longo.
Gosto de viajar, gosto de correr, gosto de trabalhar, de estudar, gosto de cinema, gosto de andar de bicicleta, gosto de ler, gosto de música. Gosto de minha família, de meus amigos. Gosto de rir. Gosto também dos meus chinelos – como diria Gilberto Freire.